A Prisão do Corpo
O prisioneiro não olhava mais para a
prisão como se fosse sua casa. O teto azul e branco ainda lhe parecia bonito,
mas agora ele percebia o quanto era inatingível. Ele percebeu que estava preso
àquele chão, no qual tantas vezes brincara.
Ele observou o invólucro de seus
pensamentos, preso naquele presídio disfarçado de casa. Observou e ficou
aterrorizado com sua cegueira. Ele estava preso a ações que não poderia
interromper. Ele necessitava se entregar às suas limitações. Ele era fraco. O
prisioneiro finalmente prestou atenção às suas correntes.
Foi com grande horror que ele se deu
conta da mais terrível verdade. Ele não estava só. Todos estavam presos. Seus
antigos guardiões, seus aprendizes, todos os que ele conhecia e os que ele não
conhecia. Eram todos prisioneiros.
Agora a cada observação ele recebia uma
nova revelação. Ele notou que nenhum dos prisioneiros estava ciente de sua
prisão, assim como ele anteriormente. Consciente, era mais fácil pensar. Será
que todos tinham sido presos arbitrariamente? Ou apenas desconheciam seus
crimes? Isto não podia continuar. Era necessário acordar os outros do seu sono
de ignorância. Ele os lideraria em uma rebelião em busca da liberdade. Era
necessário encarar o diretor da prisão de frente e exigir uma explicação.
Mas foi grande a sua decepção ao
descobrir que ninguém queria ser libertado. Os prisioneiros haviam se
acostumado tanto à prisão que já não conseguiam enxergar as correntes em suas
mãos. Para eles, ele era louco e perigoso. O prisioneiro jamais encontrou o
diretor do presídio e acabou se convencendo de que ele não existia.
Somente nesse instante, quando parou de
olhar para fora e se concentrou em seu interior, ele percebeu que ele próprio
era seu carcereiro. Ele olhou para suas mãos traidoras e viu mais uma face da
verdade. O seu corpo, invólucro dos seus pensamentos, era sua cela. Todos os
prisioneiros andavam encarcerados dentro de si próprios, presos às suas celas
ambulantes. Até mesmo seus corpos serviam ao sistema que os mantinham presos.
Todos os prisioneiros agora estavam
contra ele. Espancavam-no e o insultavam o tempo todo. Cansado de tentar
ajudá-los a enxergar a verdade, o infeliz prisioneiro dedicou-se a conseguir
sua própria liberdade. Porém parecia impossível provar sua inocência. A única
saída seria a fuga, mas seria muito doloroso e uma demonstração de culpa. Então
o prisioneiro esperou. Aos poucos sua cela foi enfraquecendo e ele pôde sair.
Teria ele conseguido a liberdade?
Continua...