“Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não deves comer.
Porque no dia em que o fizeres serás condenado a morrer”.
Gênesis
2,17
A primeira prisão
Ele foi gerado em uma prisão, embora
não tivesse consciência disso. No futuro ele não se lembraria de nada sobre
aquele local, mas naquele momento ele sentia-se seguro e confortável, como se
aquela prisão fizesse parte dele mesmo.
Só havia a escuridão, embora ele não tivesse consciência disso também, pois
o prisioneiro não enxergava e, mesmo que enxergasse, ele não saberia dar nome à
escuridão, porque ela estava ali desde o princípio confundindo-se com o
ambiente e com ele mesmo. O local era morno e agradável. Na escuridão ele
flutuava. Com sua percepção falha não era possível saber o que era em cima e o
que era em baixo. Havia paredes macias que pareciam se mover. No futuro ele não
se lembraria de nada daquilo, nem mesmo da estranha sensação de que tudo aquilo
era ele mesmo.
Ele
ouvia vozes. Não entendia o significado daqueles sons, nem sabia se eram
dirigidos a ele. Apenas ouvia. Eram várias vozes, embora algumas fossem mais
frequentes e justamente as que o agradavam mais. Muitas eram desconhecidas e o
assustavam. Mas existia uma que era especial. Quando ele a ouvia, de certa
forma sabia que ela estava se dirigindo a ele. Às vezes ele queria responder
àquela doce voz que o agradava tanto, mas não era capaz de fazer isso.
Não era possível
saber quando era dia ou quando era noite. Ele simplesmente dormia quando sentia
sono. O prisioneiro não sentia fome nem sede. Seus dias eram tranquilos e ele
apenas vivia um dia após o outro em sua doce prisão.
Então
um dia algo estranho aconteceu. As paredes macias que o protegiam pareciam aos
poucos se contrair. Era como se quisessem o expulsar. O prisioneiro ainda não
enxergava, mas podia sentir que se aproximava de algo contrário à escuridão
habitual. Ele nunca tinha sentido tanto medo. Ele reconhecia a voz que gritava.
Era a mesma que antes o acalmava tão docemente. Ao mesmo tempo em que a voz se
silenciava, ele se viu em um mundo completamente diferente. Ele sentia que era
manuseado, ouvia vozes diferentes das habituais. E então, pela primeira vez, ouviu
seu próprio som, ao mesmo tempo em que pôde ver pela primeira vez.
Tanto
espaço, havia tanto espaço! E seres tão estranhos, vultos embaçados. O medo
persistia. Alguma coisa penetrava em suas narinas, dando-lhe uma sensação de
conforto e alívio. Ele não percebia que a partir daquele momento se tornaria
escravo daquela ação. O aço frio e cortante o livrou de sua algema orgânica. O
trauma estava completo.
O prisioneiro foi colocado ao lado da voz.
Agora ela tinha feições e parecia o observar. Ele sentia-se seguro ao seu lado,
como se de alguma forma estivesse dentro de sua antiga prisão novamente. Se
pudesse escolher ele retornaria, pois ali havia muito espaço. Porém não existia
retorno. Sua condenação havia apenas começado.
Continua...